ENTREVISTA
Embrapa fala em entrevista sobre o uso de defensivos agrícolas no Brasil
Embrapa fala em entrevista sobre o uso de defensivos agrícolas no Brasil
Marcelo Morandi, chefe Geral da Embrapa Meio Ambiente e Coordenador do Grupo de Trabalho em Controle Biológico do Comitê de Sanidade Vegetal do Cone Sul (COSAVE), concedeu juntamente com Robson Barizon, pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, que atua na linha de pesquisa Dinâmica Ambiental de Pesticidas, uma entrevista sobre o Controle Biológico no Mercado Brasileiro de Defensivos Agrícolas.
Morandi, está na Embrapa Meio Ambiente desde 2001 e também já atuou como docente de Fitopatologia pela UniRV-GO e de Microbiologia Ambiental pela PUC-Campinas, é graduado e mestre em Agronomia (Fitopatologia) pela Universidade Federal de Viçosa e doutor em Agronomia (Fitopatologia) em programa sanduíche na University of Guelph, no Canadá e também pela Universidade Federal de Viçosa.
Barizon, é graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Paraná, e possui mestrado em Agronomia pela UNESP e doutorado em Agronomia (Solos e Nutrição de Plantas) pela USP, já atuou na iniciativa privada como pesquisador na área de dinâmica de pesticidas e também como analista de risco ambiental para a América do Sul.
1. O Brasil é um dos principais países consumidores de defensivos no mundo devido a vários fatores, como por exemplo, a grande área plantada e o número de safras possíveis da mesma cultura em um pequeno espaço de tempo. No geral, como vocês avaliam o uso de defensivos agrícolas no Brasil? Existem algumas práticas que podem ser melhoradas?
O bônus que temos no Brasil, de estarmos em uma zona tropical que nos permite duas ou até três safras em um ano agrícola, também tem seu preço na maior pressão de pragas decorrente da “ponte verde”, ou seja, da constante disponibilidade de plantas e clima adequado para a multiplicação destas pragas. Isso implica na necessidade de uma estratégia fitossanitária que leve em consideração essa intensificação produtiva.
Assim, há a necessidade de melhoria das práticas fitossanitárias, respeitando os princípios do Manejo Integrado – no qual houve severo retrocesso nos últimos anos – o que inclui, além do uso de agroquímicos, práticas de rotação de culturas, manejo de fertilidade, áreas de refúgio, uso correto das tecnologias de aplicação e dosagens/frequência adequados, introdução de métodos biológicos no controle de pragas nos sistemas produtivos etc.
Em parte, o uso de defensivos no Brasil se justifica pela posição de grande player do mercado de commodities e outros produtos agrícolas alimentares. Entretanto, em termos de uso de agroquímicos por unidade de área, o país se situa em uma posição intermediária em termos globais. Apesar desta posição intermediária, a tendência é de alta do consumo por unidade de área, especialmente pela emergência de resistência e introdução de novas pragas.
2. Existe no país uma grande gama de produtores rurais, desde pequenas propriedades até multinacionais. Há diferenciação na forma de conscientização de cada um desses produtores quanto ao uso correto de defensivos agrícolas? Quais são as formas adotadas atualmente?
Certamente, as diferenças socioeconômicas têm reflexo no acesso dos produtores a conhecimentos e tecnologias. E isso traz implicações em todo o processo produtivo, o que inclui o manejo de pragas e doenças. Muitas práticas equivocadas no uso de agroquímicos são claramente resultado da falta de assistência técnica adequada, especialmente nos produtores menos capitalizados e com menor acesso a conhecimento e tecnologia.
Mas, por outro lado, mesmo entre os grandes produtores muitas práticas fitossanitárias vêm sendo adotadas de forma incorreta ou sem critério técnico que atendam aos princípios de MIP. Por exemplo, a aplicação “calendarizada” de agroquímicos e a não integração com outros métodos de manejo no planejamento do cultivo (rotação de cultura, vazio sanitário, áreas de refúgio, rotação de ingredientes ativos e outros).
3. A Embrapa realiza muitas pesquisas para a melhoria no uso de defensivos, inclusive por meio de parcerias com empresas deste segmento. Quais são as principais tendências e tecnologias esperadas para melhorar ainda mais a aplicação correta de agroquímicos?
A tendência mais ampla é na direção da melhoria da eficácia das tecnologias de aplicação, com foco no atingimento do alvo e com o mínimo de perdas para o ambiente, o que consequentemente, reduz os impactos no ambiente e no próprio sistema produtivo, com a redução sobre a pressão de seleção de resistência aos princípios ativos.
Avanços no conhecimento sobre a dinâmica ambiental dos defensivos possibilitarão a melhoria tanto das formulações quanto das tecnologias de aplicação, favorecendo a proteção do ambiente.
Além disso, já é conhecido que há uma fadiga dos métodos convencionais no controle de pragas e doenças, baseado apenas na aplicação de agroquímicos. Isso demanda novas estratégias de uso racional, inteligente e responsável da integração de soluções biológicas e naturais no sistema produtivo.
4. Qual a sua projeção para o agronegócio brasileiro em 2017? De que forma esse cenário poderá impactar no mercado de defensivos agrícolas?
Como o setor está aquecido, com previsão de aumento de safra de grãos, frutas e outros produtos agrícolas, e os preços estão competitivos, tanto no mercado nacional quanto internacional, a tendência é de aquecimento também no uso de insumos, incluindo defensivos.
Inclusive esse é um sinal amarelo de que precisamos de fato redesenhar o modelo fitossanitário adotado em nossa agricultura.
5. Marcelo, você hoje é coordenador do Grupo de Trabalho em Controle Biológico do Comitê de Sanidade Vegetal do Cone Sul, e também tem experiência na área de Controle Biológico. Qual é a sua expectativa para o uso deste método de tratamento para os próximos anos?
Considerando as novas tendências que têm impactado o mercado agrícola, como a pressão regulatória pela gestão de resíduos de agroquímicos em alimentos, avaliações mais restritivas e que limitam os registros de novos agroquímicos, necessidade do manejo de resistência de pragas aos princípios ativos, a busca por novos produtos de origem biológica tem se acelerado fortemente na última década.
Os produtos biológicos têm sido buscados com ênfase em serem: ferramenta de manejo de resistência; alternativas para a falta de agroquímicos eficientes contra alguns grupos de pragas (como por exemplo, patógenos veiculados pelo solo); produtos seguros, que não deixam resíduos e contaminações e minimizam os impactos ambientais.
No Brasil, já há 132 empresas registradas no MAPA para a comercialização de produtos biológicos, o que inclui desde pequenas empresas nacionais até as grandes multinacionais do setor agroquímico. Em 2007 foi criada a Associação Brasileira de Empresas de Controle Biológico (ABCBio), que tem sido muito ativa no desenvolvimento tanto regulatório quanto de mercado.
O mercado mundial atualmente gira em torno de US$ 3 bi, com tendência de crescimento acima da média do mercado de agroquímicos. No Brasil, o mercado de biológicos representa hoje de 1 a 2 % do mercado de defensivos.
Os produtos biológicos não irão substituir completamente produtos químicos convencionais, mas eles certamente desempenharão um papel no preenchimento do vácuo do banimento de produtos químicos convencionais do mercado ou perda de eficiência por resistência, além de cobrir nichos específicos de mercado, como aqueles certificados e de produção de base ecológica.
Há ações necessárias para promover o crescimento da indústria de biopesticidas e seu efetivo uso no sistema produtivo. Algumas limitações, como fatores ambientais e condições de uso já têm sido vencidas com melhorias na tecnologia de formulação, avanços em biotecnologia e aumento da compreensão da fisiologia dos micro-organismos. Mudança do modelo um-a-um (um agente de controle biológico para um patógeno) para a combinação de organismos para aumentar o espectro de ação e a efetividade do controle tem evoluído. Este novo conceito se encaixa com os objetivos do MIP e aumenta a eficácia do biocontrole e a sua credibilidade.
O Controle Biológico não é mais o “patinho feio” da fitossanidade. É hoje uma ciência robusta e reconhecida. Soluções técnicas e tecnológicas para os desafios-chave estão disponíveis nas Instituições de P&D e nas empresas (avanços em biologia computacional, biologia molecular, química analítica, estatística etc. que permitem o entendimento das interações planta-patógeno-ACBs em diversos níveis). Os impactos sociais e ambientais do controle biológico são (em certa medida) conhecidos do público consumidor, que exigem por práticas mais sustentáveis na produção de alimentos.
Assim, um florescente “ecossistema de inovação” está em desenvolvimento, com a emergência e fortalecimento de empresas inovadoras no setor.
Equipe Global Agrochemicals, 24/02/2017