ENTREVISTA

Leonardo Furlani – Coordenador técnico de P&D da DigiFarmz fala sobre mercado de fungicidas


Sobre DigiFarmz 

A DigiFarmz Smart Agriculture é uma plataforma digital que usa dados de pesquisa a campo e algoritmos via inteligência artificial para oferecer sugestões personalizadas de manejo de fungicidas aos produtores de soja e de trigo.

Leonardo Furlani está inserido no agro há mais de 15 anos, é filho de produtor, técnico em agropecuária, engenheiro agrônomo, possui mestrado na área de fitopatologia com experiência em fungicidas. Hoje ele atua no cargo de coordenador técnico de P&D da DigiFarmz atuando no mercado do Brasil, Paraguai e Estados Unidos.

 

1.Quais são as principais diferenças entre fungicidas protetores e sistêmicos, e como a mistura de ingredientes ativos pode ajudar no manejo eficiente de doenças fúngicas?

Os fungicidas sistêmicos são capazes de serem absorvidos e alguns possuem habilidades de serem translocados para outras partes da planta, muito variável pela ação do produto. A maioria desses fungicidas possuem ação sítio-específica, ou seja, atuam em locais específicos do fungo, o que pode elevar o risco de resistência. Exemplos de fungicidas sistêmicos incluem os grupos químicos triazóis, estrobilurinas e carboxamidas.

Por outro lado, os fungicidas protetores ou protetores multissítios, criam uma barreira protetora na superfície da planta, impedindo os esporos de fungos de germinarem e penetrarem nos tecidos. Estes fungicidas geralmente não são absorvidos pela planta, embora possam ocorrer pequenas absorções ou fases de vapor em alguns casos. Eles atuam em múltiplos sítios do fungo, sendo uma estratégia importante, que reduz significativamente o risco de desenvolvimento de resistência. Exemplos comuns de fungicidas protetores incluem mancozebe, clorotalonil e oxicloreto de cobre.

Na prática, a aplicação de ingredientes ativos isolados não é recomendada. A mistura de fungicidas sistêmicos com fungicidas multissítios ou o uso de produtos que já contenham múltiplos ingredientes ativos podem ampliar o espectro de controle e reduzir os riscos de resistência. Essa combinação de ações sítio-específicas com multissítios vem se confirmando no campo como um manejo eficiente, ampliando o espectro de controle, melhorando a performance dos produtos, reduzindo o risco de resistência, aumentando a produtividade e até proporcionando um residual maior e mais seguro.

2.Em relação ao mercado de fungicidas, quais produtos você considera que foram mais utilizados durante a safra 23/24? E qual a expectativa para a safra 24/25, considerando um ano de La Niña?

Em relação à safra 23/24, pensando em sítios-específicos, os ingredientes mais utilizados pela maioria dos produtores acompanhados foram produtos à base de protioconazol e tebuconazol, comumente aplicados de 2 a 3 vezes na cultura da soja. Os protetores multissítios vem ganhando destaque nos últimos anos, principalmente devido a queda da performance de muitos ingredientes sitios-específicos. O mancozebe e o clorotalonil foram amplamente usados, ocorrendo inclusive, relatos de falta destes produtos em algumas regiões do Brasil, particularmente na região sul onde houve um volume grande de chuvas e elevadas severidades de doenças como a ferrugem asiática.

Acompanhando as performances de produtos nos últimos anos, acredito que os fungicidas protetores multissítios irão continuar a ganhar espaço, sendo estes sugeridos entrarem no programa de controle em todas as aplicações. Observa-se também um aumento na procura e utilização de produtos já formulados com misturas triplas e a chegada futura de misturas quádruplas (com quatro ingredientes ativos), o que facilita o operacional do produtor e garante formulações estáveis, reduzindo riscos de misturas de tanque perigosas. Entre esses produtos, há uma crescente demanda por aqueles à base de carboxamidas e protetores multissítios.

Considerando as possíveis condições climáticas para a safra 2024/25, é importante reconhecer que essas variações podem impactar significativamente a prevalência e a gravidade de doenças fúngicas. A previsão de La Niña é frequentemente associada a condições mais secas em algumas áreas e a padrões climáticos mais extremos em outras. Assim, as expectativas para o mercado de fungicidas são variadas, dependendo das condições climáticas específicas em diferentes regiões agrícolas. É importante ressaltar que, mesmo em anos de estiagem, os fungicidas permanecem sendo essenciais, já que algumas doenças persistem mesmo em condições extremas. Além disso, em certos casos, alguns fungicidas demonstraram não apenas efeitos fúngicos diretos, mas também efeitos fisiológicos benéficos para as plantas, auxiliando-as a enfrentar períodos de estresse. Essa combinação de benefícios reforça ainda mais a importância dos fungicidas no manejo integrado de doenças e no suporte à produtividade agrícola mesmo em anos de estiagem.

3.Em relação ao ativo Protioconazol, tivemos recentemente a queda da patente e com isso novos entrantes sendo aprovados no Brasil. Uma curiosidade é que temos acompanhado muitos casos de resistências sendo relatados, como você enxerga o efeito desse ativo?

Analisando o mercado do protioconazol como um todo, é importante termos uma visão mais “sistêmica” do assunto, uma vez que a entrada de novos produtos a base deste ativo no mercado brasileiro tem gerado preocupações em relação a efetividade. Um ponto chave que estamos analisando é a influência do cultivo e manejo da soja no Paraguai sobre o Brasil quando se refere ao manejo de doenças e em especial na dinâmica dos esporos de ferrugem asiática.

No Paraguai, o protioconazol tem sido amplamente utilizado, uma vez que já existem dezenas de produtos a base deste ativo a muitos anos, e com presença de até 5 aplicações durante uma única safra de soja, incluindo a segunda safra. Essa alta frequência de uso exerceu uma pressão de seleção intensa sobre os fungos, resultando em uma diminuição na eficácia do protioconazol a campo, especialmente contra a ferrugem asiática. Observamos que os padrões de eficácia e desenvolvimento de doenças no Paraguai tendem a se refletir no Brasil após uma ou duas safras.

No Brasil, a dependência do protioconazol permanece alta, uma vez que ele oferece um amplo espectro de controle. No entanto, a pressão de seleção similar ao Paraguai está começando a comprometer sua performance. Para mitigar esses efeitos e prolongar a sua vida útil, é crucial integrar o protioconazol com reforços, especialmente com fungicidas protetores multissítios. Esses produtos ajudam a reduzir a pressão de seleção sobre o protioconazol, mantendo sua eficácia e garantindo um manejo mais sustentável das doenças fúngicas, sendo uma estratégia recomendada para melhorar a longevidade deste ativo, especialmente diante do desafio crescente da resistência.

4.Na sua visão, existe alguma doença hoje que ainda não exista um fungicida eficiente para controle?

Atualmente existem algumas doenças que são consideradas de difícil controle, mas o sucesso do controle muitas vezes depende mais do momento correto de iniciar o tratamento do que do produto específico utilizado. Em outras palavras, acertar o timing do controle pode ser mais crucial do que a escolha do fungicida em si.

Na cultura da soja, a doença mais famosa e lembrada por muitos produtores é a ferrugem asiática. Apesar de ser uma doença de progressão exponencial, há diversos fungicidas disponíveis no mercado e que apresentam bons resultados.

No entanto, o mofo-branco, causado pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum, exemplifica um desafio maior. Para o melhor controle, é essencial não apenas escolher os fungicidas adequados e específicos, mas também aplicá-los no momento correto, com intervalos apropriados e adotar um manejo integrado que inclui práticas como uso de palhada, seleção de cultivares que beneficiem a tecnologia de aplicação, aplicação de biológicos, espaçamentos adequados, entre outros.

Outras doenças, como a antracnose (Colletotrichum spp.) e mancha-alvo (Corynespora cassiicola) são doenças com poucos ingredientes ativos eficazes, o que as torna particularmente difíceis de controlar. Essas doenças exigem uma abordagem abrangente e integrada.

O ponto mais importante é não colocar toda a responsabilidade de controle sobre os fungicidas. Eles são apenas uma parte do manejo integrado. A escolha correta da cultivar, época de semeadura, considerar as condições de clima e pressão de doenças, devem ser levadas em consideração para ajudar a tomar as melhores decisões. O fungicida deve ser visto como uma ferramenta complementar dentro de uma estratégia de manejo abrangente e inteligente.

5.Nesse contexto, em relação à pesquisa e desenvolvimento, qual é a expectativa para os próximos lançamentos no mercado?

A expectativa para os próximos lançamentos no mercado de fungicidas é focada no aumento de investimentos em misturas triplas e até quádruplas. Esses novos produtos visam oferecer um maior valor agregado e um espectro de controle mais amplo, frequentemente combinando ingredientes ativos dos grupos das carboxamidas e protetores multissítios.

Embora novos ingredientes ativos estejam em desenvolvimento e sejam esperados nos próximos anos, assim como os últimos lançamentos, eles provavelmente não representarão um salto significativo em termos de controle de doenças. Por isso, é crucial que a responsabilidade pelo manejo de doenças não recaia apenas sobre os fungicidas.

Um manejo eficaz de doenças deve considerar todos os fatores importantes para o desenvolvimento das doenças, como a escolha da cultivar, a época de plantio, e as condições climáticas. A seleção adequada da cultivar é particularmente importante e deve ser integrada a uma estratégia abrangente de manejo de doenças.

6.Na plataforma da Digifarmz, como funciona a metodologia de análise do custo-benefício?

A DigiFarmz é uma plataforma digital que usa dados de pesquisa a campo, algoritmos baseados em inteligência artificial, onde são considerados mais de 55 fatores para trazer sugestões personalizadas de manejo de fungicidas para as culturas da soja e do trigo.

Na plataforma o usuário cadastra sua fazenda, seu talhão em específico, as cultivares que planeja semear, entre outras informações. Com isso a plataforma começa a apresentar para cada talhão imagens de satélite (NDVI), captura os dados meteorológicos específicos para cada talhão, oferecendo informações precisas quanto a suscetibilidade das cultivares, eficácias dos fungicidas, misturas de fungicidas, curvas dose x respostas, número de aplicações e datas de aplicações sugeridas, diversos alertas, anotações, catálogos de insumos, entre muitas outras funcionalidades. Com o produtor colocando os preços dos produtos, a plataforma fornece uma análise personalizada, onde o usuário poderá verificar o custo x benefício empoderando assim as tomadas de decisão.

 

Equipe Global Crop Protection, 14/05/2024

Fonte da imagem: Freepik

 

 

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