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Prof. Dr. Marcos Fava Neves
Vinicius Cambaúva
Beatriz Papa Casagrande
Reflexões dos fatos e números do agro em janeiro/fevereiro e o que acompanhar em março
Na economia mundial e brasileira, o Banco Central atualizou os indicadores da economia brasileira no Boletim Focus divulgado no dia 17/02. O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) foi projetado em 5,60% no final deste ano e em 4,35% no término do próximo (ambos em alta de um mês a outro). Já o PIB (Produto Interno Bruto) deve crescer 2,01% em 2025 e 1,70% em 2026 (os dois em queda). Enquanto isso, a taxa de câmbio é prevista para encerrar o ano atual e o subsequente a R$ 6,00 (manutenção). Para terminar, a projeção para a taxa Selic é de 15,00% neste ano (manutenção) e 12,50% no próximo (alta).
No agro mundial e brasileiro, o Índice de Preços dos Alimentos calculado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) ficou em 124,9 pontos em janeiro de 2025, uma redução de 1,6% (2,1 pontos) em relação a dezembro. As quedas nos índices do açúcar, óleos vegetais e carnes superaram os aumentos observados nos setores dos laticínios e cereais. Os cereais valorizaram ligeiramente (+0,3%), principalmente devido aos preços do milho que ultrapassaram os níveis alcançados há um ano, impulsionados por estoques apertados, condições adversas na Argentina, avanços mais tímidos na safrinha brasileira e menor produção norte-americana. Os óleos vegetais também apresentaram queda (-5,6%), resultado da queda nos preços internacionais do óleo de palma e de canola, enquanto as cotações do óleo de soja e de girassol se mantiveram estáveis. Para as carnes, o índice também caiu (-1,4%), sendo influenciado pela demanda reduzida das carnes ovina e suína após o período de festas e restrições da União Europeia. Os laticínios registraram alta (+2,4%) muito por conta das cotações do queijo que obtém forte demanda global em meio a uma produção em recuperação lenta e fortes vendas no varejo doméstico nos principais países produtores. Por fim, o açúcar obteve queda significativa (-6,8%) atribuída às melhores perspectivas de oferta global para a temporada 2024/25, devido a condições climáticas favoráveis no Brasil. Além disso, a decisão do governo indiano de retomar as exportações de açúcar, após um período de restrições iniciadas em outubro de 2023, também contribuiu para pressionar os preços para baixo.
No 5º relatório mensal de acompanhamento da safra 2024/25 de grãos no Brasil, a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) estimou uma oferta de 325,7 mi de t de grãos, ampliando em mais 3,4 mi de t no comparativo com o relatório passado. Se confirmada, essa produção será 9,4% superior à da safra passada. Em relação a área, a Conab indica 81,6 mi de ha, 200 mil a mais do que no último mês e 2,1% superior ao do ciclo passado; ou 1,69 milhão de ha adicionais.
No milho, no relatório de fevereiro, referente a safra global de grãos 2024/25, o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) reduziu, em mais um mês, a oferta: de 1.214,34 mi de t para 1.212,47 mi de t. Se este volume for confirmado, ele será 1,4% inferior ao da safra passada. Entre os principais produtores, o USDA: manteve os volumes dos Estados Unidos (377,6 mi de t) e da China (294,9 mi de t); reduziu o do Brasil (de 127 para 126 mi de t); manteve o da União Europeia (58 mi de t); e reduziu o da Argentina (de 51 para 50 mi de t). Ao final do ciclo, os estoques devem fechar em 290,3 mi de t, 8,0% inferior ou 25,5 mi de t a menos do que 2023/24; daí vemos as reações de preços que citaremos adiante.
No Brasil, a Conab elevou as projeções para a oferta de milho, em vista da perspectiva climática positiva e do ritmo acelerado de plantio. No relatório de fevereiro, o órgão estima 122 mi de t, 2,4 mi de t a mais do que no último mês; e 5,5% superior a produção do ciclo passado. Em relação a área, A Conab manteve 21,2 mi de ha (+ 0,7% do que 2023/24), sendo está distribuída: 3,71 mi de ha em 1ª safra (- 6,6%); 16,83 mi de ha em 2ª safra (+ 2,4%); e 649,4 mil ha em 3ª safra (+ 0,9%). Em relação a produtividade, a Conab estima 5.496 kg/ha nas três safras, 4,8% maior.
No campo, a colheita do milho 1ª safra estava em 21,1% até 16 de fevereiro, pouco abaixo do avanço no mesmo período do ano passado, de 21,4%. Os estados com maior avanço são o Paraná com 67,0% (2024: 40,0%), Rio Grande do Sul com 60,0% (2024: 59,0%) e Santa Cataria com 24,2% (2024: 32,0%). Em relação ao milho 2ª safra, o plantio havia alcançado 35,7% das áreas até 16/02, abaixo dos 45,3% registrados no mesmo período do ano passado. No Paraná, o progresso é de 46,0% (2024: 40,0%); no Mato Grosso, de 43,3% (2024: 67,1%); e no Tocantins, de 40% (2024: 35,0%).
O contrato de milho com vencimento em mai/25 estava cotado em US$ 4,974/bushel no fechamento da nossa coluna, 2,2% acima dos preços registrados na mesma data do mês anterior (US$ 4,865/bushel).
Na soja, o USDA também reduziu os números da soja. No relatório de jan/2025, a previsão era de 424,25 mi de t e, neste (fev/2025), fomos a 420,76 mi de t. Apesar da baixa, ainda estamos falando de uma produção 6,5% maior do que a do último ciclo; ou 25,8 mi de t adicionais. Brasil segue com 169,0 mi de t (+ 10,4%) e os Estados Unidos com os mesmos 118,84 (+ 4,9%). Na Argentina, a condição climática desfavorável fez o órgão baixar em 2,0 mi de t a previsão de produção, agora em 49,0 mi de t (+ 1,6%). Já os estoques finais devem ficar em 124,4 mi de t, 10,6% maiores ou 11,9 mi de t adicionais.
Com pouco mais de ¼ das áreas colhidas, a Conab manteve a estimativa de produção de soja no mesmo nível do relatório anterior: 166,01 mi de t, 12,4% superior a 2023/24 ou 6,7 mi de t adicionais. Em relação a área, o órgão manteve 47,5 mi de ha, 2,8% maior do que a safra passada ou 1,2 mi de ha adicionais. Já a produtividade foi reduzida um pouco neste relatório: de 3.509 kg/ha (jan) para 3.499 kg/ha (fev). Vamos observar como vem o relatório de março, afinal, pelo que temos visto junto a produtores, os resultados tem sido bem positivos nas principais regiões produtoras.
O progresso da colheita de soja no Brasil alcançou 25,5% até o dia 16 de fevereiro, um pouco abaixo dos 29,4% de avanço na mesma data de 2024. O Mato Grosso, maior produtor, registra progresso de 47,3% (2024: 61,3%); o Tocantins encontra-se com 35,0% dos campos colhidos (2024: 20,0%); o Paraná está com 33,0% (2024: 30,0%); e Goiás tem 24,0% de avanço (2024: 26,0%).
O contrato da soja para mar/25 em Chicago estava cotado em US$ 10,318/bushel em 24/02, conclusão de nossa coluna, 0,3% abaixo da cotação há um mês (24/01: US$ 10,558/bushel)
No algodão, o USDA praticamente manteve a oferta global de algodão em 2024/25 nos mesmos níveis do relatório anterior: 26,2 mi de t, volume que é 6,5% maior do que o último ciclo ou 1,64 mi de t adicionais. Nos principais produtores, as estimativas são: China com 6,75 mi de t (+ 13,4%); Índia com 5,44 mi de t (- 1,6%); Brasil com 3,70 mi de t (+ 16,7%) e Estados Unidos com 3,13 mi de t (+ 19,4 mi de t). Os estoques globais da pluma devem fechar 2024/25 com 17mi de t, 6,3% superior ao de 2023/24.
No Brasil, a Conab elevou a estimativa de oferta do algodão neste mês de fevereiro; estava em 3,69 mi de t (jan) e fomos a 3,76 mi de t. Se confirmada, essa produção será 1,6% maior do que a do último ciclo. O efeito de alta na oferta é resultado do crescimento da área plantada, que está estimada em 2,04 mi de ha, 4,8% maior do que 2023/24. Já a produtividade segue em 1.847 kg/ha de pluma (- 3,0%).
E com o avanço da colheita da safra verão, o plantio de algodão deu grande salto neste último mês. Segundo a Conab, até 16/02, o avanço era de 95,9% das áreas previstas no Brasil para 2024/25, enquanto estava em
99,0% na mesma data de 2024. Mato Grosso do Sul, Maranhão e Piauí já concluíram o plantio; enquanto os maiores produtores, Mato Grosso e Bahia, seguem com 95,8% (2024: 100,0%) e 95,0% (2024: 96,2%), respectivamente. Goiás e Minas Gerais, os outros 2 estados de destaque, encontram-se com iguais 97,0%.
Em Chicago, o contrato futuro de algodão para mai/25 estava em 67,91 centavos de dólar por libra-peso no fechamento da nossa coluna, apenas 0,1% acima da cotação há 30 dias (67,81 cents/lbp).
Nas demais culturas, outro grupo que sofreu revisão das estimativas pela Conab foi o das culturas de inverno. Segundo a companhia, a produção total em 2025 será de 11,04 mi de t, 14,9% superior a do ciclo passado. Os destaques serão: trigo com 9,12 mi de t (+ 15,6%); a aveia com 1,11 mi de t (+ 6,9%); a cevada, entregando 464,7 mil t (+ 6,0%); e a canola com 294,5 mil t (+ 50,6%). A área com culturas de inverno deve somar 3,83 mi de ha, 0,3% inferior a do ciclo 23/24.
As exportações do agro do Brasil totalizaram R$ 11 bilhões em janeiro de 2025, isto é, o segundo maior valor da série histórica para o mês. Mesmo assim, o montante é 5,3% menor do que o registrado no mesmo período de 2024 (R$ 11,6 bilhões), de acordo com dados da Secretaria de Comércio e Relações Internacionais (SCRI/Mapa). O cenário é explicado pela queda no volume exportado (-10,10%), principalmente da soja e do milho, que recuaram 3,0 mi de t em conjunto (de 7,7 para 4,7 mi de t) de um ano a outro. Isso porque mesmo com estimativas recorde para a safra de grãos, o atraso no início do plantio reduziu a oferta disponível para este mês. Porém, os preços dos produtos valorizaram 5,3%, o que compensou, em parte, a queda no volume.
Os seis principais setores exportadores do setor agro foram, em ordem: carnes (US$ 2,08 bilhões | 18,9% do total exportado); produtos florestais (US$ 1,51 bilhão | 13,8%); café (US$ 1,45 bilhão | 13,2%); complexo soja (US$ 1,11 bilhão | 10,1%); complexo sucroalcooleiro (US$ 1,10 bilhão | 10,0%); e cereais, farinhas e preparações (9,1%). Além disso, as exportações de café verde, celulose, algodão e carne suína foram recordes para o mês. Enquanto isso, todos os demais setores do agro foram responsáveis por US$ 2,7 bilhões embarcados ao exterior, o que representa um aumento anual de 32,5%, demostrando um nível de desconcentração entre os produtos.
Nas importações de produtos agropecuários, o valor foi de US$ 1,8 bilhão em janeiro deste ano, sendo 9,5% acima do mesmo mês de 2024. Desse total, os fertilizantes contribuíram com US$ 931,3 mi (+15,5%) e os defensivos com US$ 409,9 mi (+11,4%). Com isso, o superávit da balança comercial do setor em janeiro foi de US$ 9,6 bilhões, abaixo dos US$ 9,9 bilhões do ano anterior.
O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) divulgou que as exportações de café brasileiro em janeiro apresentaram uma queda de 16,0% em volume, mas registraram um aumento expressivo de 60,0% em receita. A redução no volume exportado reflete desafios logísticos e oscilações na produção, enquanto a valorização dos preços no mercado internacional impulsionou o faturamento. A demanda global segue aquecida, e os preços mais elevados têm compensado a menor quantidade de café embarcada.
A previsão para a safra de laranja 2024/25 foi revisada para 228,5 mi de cx, o que representa uma redução de 1,7% em relação à estimativa anterior (232,4 mi de cx), segundo o Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus). O ajuste reflete os impactos das condições climáticas adversas, que reduziram a produtividade nas principais regiões produtoras, levando a uma projeção menor do que a inicialmente prevista. Apesar dessa revisão, o novo volume estimado ainda indica uma recuperação em comparação com as safras anteriores, demonstrando a resiliência do setor e seu potencial de crescimento.
A previsão de uma supersafra de grãos para 2025 pode levar o Brasil a registrar um recorde de déficit em armazenagem, já que o volume de produção tende a ultrapassar de forma significativa a capacidade de estocagem atual, estimada em estimada em 210,1 mi de t. O cenário revela uma disparidade de 112,2 mi de t entre o crescimento da produção e os investimentos em infraestrutura logística, o que pode resultar em sérios
gargalos na comercialização, perdas pós-colheita e impactos negativos nos preços internos. Especialistas alertam que a insuficiência de silos e depósitos adequados pressiona o setor e o governo a adotar medidas emergenciais para evitar que esse excesso produtivo se converta em um problema econômico e logístico sem precedentes para o agronegócio brasileiro.
Concluindo a nossa análise do agro, apresentamos os principais preços do setor na data de fechamento da coluna. Na soja, considerando entrega em cooperativa do estado de São Paulo, a saca (60kg) estava em R$ 123,10 no mercado SPOT. Já o contrato para mai/2025 era cotado em R$ 126,00/sc. No milho, o preço físico era de R$ 81,00/sc; enquanto o futuro para mai/2025 (na B3) fechava em R$ 81,07/sc. Já o algodão (Base Esalq) estava em R$ 138,18/@. Demais preços, considerando Cepea/Esalq como referência, seguem: café arábica, R$ 2.588,42/sc, alta mensal de 3,20%; trigo Paraná em R$ 1.470,97/t (+ 3,1%); laranja indústria em R$ 80,91/cx (40,8kg) (-6,4%); e o boi gordo em R$ 314,20/@ (-3,2%).
Os cinco fatos do agro para acompanhar em março são:
- Progresso da colheita de soja no Brasil e as produtividades registradas. Com ritmo um pouco mais lento do que no último ano (MT está 14 p.p. “atrasado”), vamos avaliar se teremos algum impacto na produtividade, mesmo que positivo (mais tempo no campo; melhor distribuição de chuvas).
- No milho e no algodão (2ª safras), apesar dos atrasos no plantio, há uma percepção de maior interesse por parte do agricultor. O cereal está 10 p.p. atrasado no comparativo com o plantio do último ano. Ainda assim, a Conab ampliou a área e oferta, demonstrando um aumento da área cultivada.
- Clima e previsões para este mês de março que marca o limite de janela de plantio da 2ª safra nas principais regiões produtoras. Vale analisar também os estágios e condições de desenvolvimento, especialmente do milho e do algodão.
- Acompanhar o dólar e a inflação, que veio forte. Quais os impactos na economia, na taxa de juros e nas expectativas de plantio e comercialização
- Seguir acompanhando o cenário internacional: as medidas de Donald Trump e seus impactos no agro; as possíveis negociações para fim da guerra entre Rússia e Ucrânia; as medidas de resposta de grandes economias como a China e União Europeia; e a nova forma que se instala na relação entre países e blocos comerciais na geopolítica global.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) da Faculdade de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) e da Harven Agribusiness School (Ribeirão Preto – SP). Sócio da Markestrat Group. É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em DoutorAgro.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves).
Vinícius Cambaúva é associado na Markestrat Group e professor na Harven Agribusiness School, em Ribeirão Preto – SP. Engenheiro Agrônomo pela FCAV/UNESP, mestre e doutorando em Administração pela FEA-RP/USP. É especialista em comunicação estratégica no agro.
Beatriz Papa Casagrande é consultora na Markestrat Group, aluna de mestrado em Administração de Organizações na FEA-RP/USP e especialista em inteligência de mercado para o agronegócio.