COLUNISTAS
Atraso no Plantio dos EUA e o Clima no Brasil: Mercados de Olho!
Vamos às reflexões dos fatos e números do agro em maio e o que acompanhar em junho. Na economia brasileira, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), chegou a 1,06% em abril, valor que é 0,56 ponto percentual menor que o índice de março (1,62%). Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo dado, foi a maior variação para um mês de abril desde 1996. Com isso, o IPCA acumula alta de 3,3% em 2022, e de 12,1% nos últimos 12 meses. As maiores oscilações vieram de “alimentos e bebidas” e dos “transportes”; juntos, contribuíram com 80% do IPCA de abril. No grupo dos alimentos, as variações mais relevantes vieram com a batata-inglesa (+18,3%), o leite longa vida (+10,3%), o óleo de soja (+8,3%), o pão francês (+4,5%) e as carnes (+1,02%). Cenário de inflação de alimentos segue preocupante!
O Boletim Focus (Bacen) do Banco Central, de 02 de maio (o mais recente divulgado até o momento), indica: IPCA com variação de 7,9% em 2022 e de 4,1% ao final de 2023; PIB (Produto Interno Bruto) com crescimento de 0,7% em 2022 e 1,0% ao final do próximo ano; câmbio fechando em R$ 5,00 e R$ 5,04, respectivamente; e, por fim, a Selic em torno de 13,25% ao final de 2022 e em 9,25% ao findar 2023. A economia permanece com as previsões relativamente estáveis, sem melhorias. Vamos seguir de olho!
No agro mundial e brasileiro, segundo a FAO (Agência das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação), o índice de preços de alimentos alcançou 158,5 pontos em abril, uma queda de 0,8% em relação a março, mês em que se havia registro do maior nível histórico. Apesar da baixa, que já representa um alívio, o indicador ficou 29,8% acima do que foi registrado em abril de 2021. O comportamento é resultante da queda de 5,7% no índice dos óleos vegetais e de 0,7% nos preços de cereais. Por outro lado, os índices do açúcar, da carne e de laticínios cresceram 3,3%, 2,2% e 0,9%, respectivamente.
No 8° boletim mensal (maio) sobre a estimativa da safra brasileira de grãos em 2021/22, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) elevou a expectativa da oferta para o ciclo: de 269,3 milhões de t em abril para 271,8 milhões de t em maio (2,5 milhões de t a mais). Com isso, a produção brasileira nesta safra deve ser 6,4% maior do que em 2020/21. Os principais acréscimos em termos de volume, no comparativo com os valores declarados em abril, vieram com a soja (+1,4 milhão de t), o milho (+592 mil t) e o trigo (+223 mil t). Para a oleaginosa, a produção estimada em maio foi de 123,8 milhões de t, 10,4% menor que o ciclo passado. No milho, a oferta total deve ficar em 116,2 milhões de t (+33,4%), sendo que a 1ª safra deve entregar 24,7 milhões de t (-0,2%), a safrinha outros 89,3 milhões de t (+47,0%) e a 3ª safra 2,2 milhões de t (+36,3%). No trigo, que também foi destaque para o mês, devemos produzir 8,13 milhões de t, 6,0% a mais do que no último ciclo. Os conflitos entre Rússia e Ucrânia e os altos preços do cereal no mercado internacional têm motivado os produtores brasileiros a cultivarem o grão, tanto que a área deve ser acrescida em 30 mil ha no Brasil. Por fim, para o algodão em pluma, a produção estimada é de 2,82 milhões de t, 19,5% a mais do que as 2,36 milhões de t do ciclo 2020/21. Na torcida para que o clima continue ajudando e estes números se concretizem!
Ainda sobre o trigo, os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, Bahia e Distrito Federal deverão plantar 280 mil ha do cereal na safra 2022/23, segundo a Embrapa Trigo, o que representa alta de 11,0% em relação ao ciclo passado, estimulada especialmente pela alta demanda e preços externos do cereal, resultados da guerra no Leste Europeu.
No campo, a Conab estima que até 14 de maio, 96,8% da soja havia sido colhida no país contra 98,5% na mesma data do ano passado; Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Tocantins já concluíram as operações. No milho, a colheita da 1ª safra encontra-se com progresso de 80,1%; era de 73,2% no mesmo período do último ciclo. Já o plantio da 2ª safra foi concluído em todo país e as lavouras encontram-se nos seguintes estágios (média nacional): 50,4% está em enchimento de grãos; 26,9% sob floração; 6,9% ainda seguem em desenvolvimento vegetativo; e 15,7% já estão em maturação. No algodão, a Conab indica que a colheita foi iniciada nos estados do Mato Grosso do Sul e Bahia, mas o progresso ainda é lento (apenas 0,2%). Por fim, a safra de inverno do trigo está com 16,2% das áreas plantadas frente a 8,4% na mesma data de 2021; o cereal também larga na frente!
Apesar do aumento nas estimativas da oferta de milho 2ª safra (pela Conab), a Consultoria AgRural reduziu suas projeções em 5 milhões de t para a região Centro-Sul entre abril e maio, por conta da falta de umidade em algumas localidades. Segundo a consultoria, a oferta do cereal deve ficar em 80,9 milhões de t; há 30 dias, a estimativa era de quase 86 milhões de t. As regiões mais afetadas pela falta de umidade são as áreas de plantio tardio no Mato Grosso e diversas áreas no estado de Goiás.
O IBGE divulgou novas estimativas para a produção de café em 2022, indicando uma colheita de 56,1 milhões de scs (60 kg), crescimento de quase 15% em comparação com o ano passado. Desse total, 38,7 milhões de scs (ou 69%) são referentes ao café do tipo arábica; enquanto que os outros 17,4 milhões de scs (31%) serão colhidas do tipo robusta.
Em abril, as exportações do agronegócio brasileiro alcançaram a cifra de US$ 14,86 bilhões, valor 14,9% maior que a receita de abril de 2021 e representando 51,5% de todas as vendas externas do país, um novo recorde para o mês! A alta na receita foi motivada pelo aumento nos preços dos produtos de 31,8%, já que os volumes forem menores em 16,8%. Na liderança, o complexo soja exportou US$ 8,08 bilhões (+7,4%), embora os volumes tenham sido de 13,45 milhões de t (-24%); a redução na quantidade exportada pelo grupo é explicada pela baixa no volume de soja em grão embarcada, que foi 28,8% menor (11,47 milhões de t). Na segunda posição aparecem as carnes, com US$ 2,15 bilhões (+36,9%), sendo que a carne bovina exportou US$ 1,10 bilhão (+56,2%), a de frango US$ 802,8 milhões (+34,3%) e a suína US$ 191,22 milhões (-17,0%). Na sequência (3°), temos os produtos florestais com a cifra de US$ 1,49 bilhão (+23,1%). Na quarta posição está o café com receita de US$ 734,16 milhões (+43,5%) e, fechando o top 5, temos o complexo sucroalcooleiro que vendeu US$ 589,8 milhões (-8,1%); resultado da queda de 14,5% na venda mensal do açúcar (US$ 503,2 milhões). No acumulado do ano, entre janeiro e abril, o Brasil já exportou US$ 48,56 bilhões (+34,5%).
Do lado das importações, os destaques para abril foram os seguintes: a compra de US$ 2,10 bilhões em fertilizantes (+296,7%) com volume de 3,25 milhões de t (+72,4%); e de defensivos agrícolas em US$ 376,3 milhões (+122,9%) e 38,4 mil t (+50,0%). No total, as importações do setor somaram US$ 1,32 bilhão (+14,8%), o que possibilitou um saldo de US$ 13,54 bilhões à economia brasileira (+15,0%).
Segundo a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais, as exportações de soja devem cair 43% no mês de maio, em comparação com o mesmo mês de 2021. Ao todo, o Brasil deve exportar 8,1 milhões de t do grão. O volume também é menor que as 11,3 milhões de t embarcadas em abril (-28,3%). Este comportamento é resultado da menor oferta da leguminosa neste ciclo, especialmente em vista dos eventos de seca no Sul do Brasil e no Mato Grosso do Sul. Já as exportações de óleo de soja devem alcançar 1,8 milhão de t em 2022, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), graças à maior demanda internacional pelo produto. O consumo interno, por sua vez, está estimado em 7,9 milhões de t. Ainda segundo a associação, os embarques da soja em grão, farelo e óleo devem trazer ao Brasil um montante de aproximadamente US$ 58 bilhões durante o ano, o que equivale a um crescimento de 20,7% frente ao ano passado. Incrível entrada de recursos ao país!
No âmbito internacional, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) em seu relatório de maio, trouxe as perspectivas para a safra 2022/23 de grãos, indicando uma produção de milho em 1,18 bilhão de t, volume que deve ser 3,0% menor que o da safra 2021/22 (ou 35 milhões de t a menos). Os principais reflexos dessa redução estão na estimativa de menor oferta nos Estados Unidos, indicada em 367,3 milhões de t (-4,5%), devido à redução das áreas plantadas com o cereal; e na Ucrânia, que deve entregar 19,5 milhões de t (-54%, ou 22,6 milhões de t a menos), em vista dos conflitos com a Rússia. Para o Brasil, a produção prevista para 22/23 ficou em 126,0 milhões de t, 10 milhões a mais do que o esperado para o ciclo atual ou crescimento de 8,6%. Já as exportações devem crescer 36,7% no Brasil, alcançando 46,5 milhões de t e, com isto, devemos voltar a posição de 2° maior exportador, entregando quase 26% de todo o milho consumido no mundo. Por fim, os estoques globais do cereal devem voltar a cair neste próximo ciclo, após uma recuperação no passado: a previsão é de que fique em torno de 305,1 milhões de t, 1,4% menor.
Na soja, a estimativa do USDA é de uma produção global em 394,7 milhões de t, 13% maior do que 2021/22 ou 45,3 milhões de t a mais. Nos principais produtores, o cenário será o seguinte: o Brasil deve produzir 149,0 milhões de t (+19,2% ou +24 milhões de t); nos Estados Unidos, serão 126,3 milhões de t (+4,6% ou +5,6 milhões de t); e na Argentina a oferta está estimada em 51,0 milhões de t (+21,4% ou +9 milhões de t). Nas exportações, o Brasil deve ampliar ainda mais o volume embarcado, das 82,8 milhões de t de 21/22 para 88,5 milhões de t em 22/23 (+6,9%), mantendo sua participação de 52% no mercado global. Os estoques globais, por sua vez, devem ser maiores, alcançando 99,6 milhões de t, 14,4 a mais do que 21/22 ou crescimento de 16,9%.
Nos Estados Unidos, o USDA indicou que o plantio da safra de grãos teve uma ligeira evolução na segunda quinzena de maio, mas segue em atraso, conforme apurado até o último dia 16. No milho, o avanço veio conforme a expectativa do mercado, com o plantio em 49%, mas ainda bem atrasado em relação aos 78% do ano anterior e 67% da média dos últimos cinco anos. Já na soja, o esperado era de 29%, mas o valor apurado veio 1 p.p. acima (30,0%), também abaixo dos 58% de 2021 e da média de 39% para o período. Como consequência, as cotações das commodities sofreram altas em Chicago. No trigo, 39% das áreas já estão semeadas, contra 83% no ano anterior e 67% na média. Atenção para bons momentos de comercialização!
O governo argentino autorizou o plantio de uma variedade transgênica de trigo, a HB4 desenvolvida pela Bioceres. O material apresenta maior nível de tolerância à seca e resistência ao glufosinato. Com isso, nosso vizinho se tornou o primeiro país a aprovar a semeadura e comercialização de transgênicos para a cultura. Vale lembrar que a Argentina é um dos maiores produtores do cereal e que o conflito do Leste Europeu abriu uma oportunidade de crescimento da oferta.
De volta ao cenário nacional, o período entre o final de abril e início de maio também foi marcado pelas feiras agropecuárias em diferentes regiões do Brasil, consolidando o retorno dos grandes eventos presenciais do setor. Em Ribeirão Preto, São Paulo, a Agrishow reuniu público recorde em seus 5 dias de evento, com mais de 193 mil visitantes, 30% a mais que 2019 (última edição antes da pandemia). Em volume de negócios, o resultado foi impressionante! O faturamento alcançou R$ 11,2 bilhões, 287% a mais que 2019, sendo que a expectativa inicial dos organizadores era de somar até R$ 6 bilhões. Em Uberaba (MG), a 87ª edição da ExpoZebu movimentou mais de R$ 350 milhões em negócios. Apenas com leilões foram R$ 105 milhões, 70% a mais que em 2021. Além disso, foram exibidos 2.200 animais, 15% a mais do que na última edição presencial em 2019. Já o público foi de cerca de 430 mil pessoas em 10 dias de evento, quase 50% maior que 2019.
Em sua divulgação de maio, o Mapa reajustou o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) de 2022 para R$ 1,236 trilhão, valor 2,7% superior ao obtido durante o ano passado. As cadeias da agricultura devem faturar R$ 881,2 bilhões (+7,3%), com grande destaque para o crescimento das receitas do café (+47,3%), do algodão (+43,2%) e do milho (+22,2%), sendo que apenas com o cereal os agricultores devem faturar R$ 163,84 bilhões. Na soja o balanço é negativo em relação ao ciclo anterior (-9,6%) visto às adversidades climáticas enfrentadas no Sul e Centro-Sul do país. Por sua vez, as cadeias da pecuária devem responder por R$ 355,7 bilhões (-7,2%), com movimentação negativa generalizada para as carnes.
Na esfera do financiamento agrícola, entre os meses de julho de 2021 e abril de 2022, a adesão ao crédito rural pelos agricultores brasileiros cresceu 22,0%, de acordo com o MAPA. Ao todo, já foram contratados mais de R$ 230 bilhões neste ciclo. Sobre o seguro agrícola, o MAPA anunciou a liberação de R$ 990 milhões em recursos para a contratação de 140 mil apólices nos próximos seis meses. A medida visa proteger os agricultores contra os sinistros ambientais, mitigando os efeitos do clima durante o ciclo. Apenas nos três primeiros meses de 2022, já foram pagos R$ 5,8 bilhões em indenizações a produtores, o que reforça o importante papel desse mecanismo de proteção.
Marcos Fava Neves é Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio.