ENTREVISTA

Entrevista: Especialista fala sobre o uso de herbicidas na agricultura brasileira


PEDRO JACOB CHRISTOFFOLETI
PROFESSOR SENIOR ESALQ/USP – ÁREA DE BIOLOGIA E MANEJO DE PLANTAS DANINHAS
DIRETOR TÉCNICO – AGROCON ASSESSORIA AGRONÔMICA LTDA

Engenheiro Agrônomo e Mestre em Agronomia (Fitotecnia) pela Universidade de São Paulo – USP, Doutor em Weed Science pela Colorado State Universty. É professor associado – livre docente da Universidade de São Paulo, do Departamento de Produção Vegetal. Foi presidente da Sociedade Brasileira da Ciência das Plantas Daninhas, Membro honorário da Weed Science Society of America (Sociedade Norte Americana da Ciência das Plantas Daninhas. Atualmente é Prof. Senior da ESALQ/USP e diretor da empresa Agrocon Assessoria Agronômica Ltda.

1. Pensando no mercado de herbicidas, qual é a sua principal tendência para a Safra 2020/21? Você vê alguma adequação e alteração nos manejos que já são empregados em campo?

O manejo de plantas daninhas em cultura de grãos, notadamente a soja, tem como principal desafio o controle de plantas daninhas resistente ou tolerantes a herbicidas, em especial ao glifosato. Assim, a mudança substancial que vejo no mercado é a corrida para os herbicidas alternativos de manejo destas plantas daninhas. Assim, entendo que os inibidores da ACCase continuarão tendo incremente de uso no controle de gramíneas resistentes ao glifosato, assim como inibidores da Protox e auxínicos no controle de folhas largas, além dos inibidores da ALS. No entanto, o maior incremento acredito que ocorrerá na adoção de herbicidas pré emergentes, com o intuito de evitar que plantas resistentes ao glifosato necessitem de herbicidas pós emergentes após a semeadura da soja.

2. Considerando a crescente resistência destas plantas aos princípios ativos, quais medidas as empresas de defensivos e os produtores devem tomar para amenizar este problema?

Para a mitigação dos problemas de resistência é necessário que o produtor adote medidas integradas em todo o sistema de produção de sua propriedade, começando por um sistema de produção diversificado. O uso de culturas de cobertura, aliada a aplicação de herbicidas pré-emergentes é sem dúvida uma das formas inteligentes de manejo de plantas daninhas resistentes. Outra forma é o manejo outonal, ou seja, o controle de plantas daninhas resistentes durante o período de pousio, na pós colheita da segunda safra, para as regiões onde esta modalidade de cultivo é prática. Finalmente, o uso de residuais na semeadura das culturas, tanto da primeira safra, quando da segunda safra. Assim, entendemos que as empresas de defensivos devem, além de disponibilizar as tecnologias para estas modalidades de aplicação, treinar seu corpo técnico para orientação de seus clientes, e promover eventos que visam orientar os produtores na adoção destas tecnologias.

3. Pensando na proibição do Paraquat no Brasil, qual será o impacto no custo de produção para o Sojicultor? Neste sentido, quais serão as saídas que deverão ser implementadas no manejo desta cultura?

Com a possível proibição da comercialização e uso do Paraquat no Brasil, o produtor terá que se adaptar, principalmente, em dois momentos em que este herbicida é usado. Primeiro na dessecação em pré-plantio, principalmente no sistema de dessecação sequencial, quando o paraquat é usado como herbicida de contato, junto com o residual. Também uma das situações onde o produtor terá que se adaptar é na dessecação pré colheita da soja, em que o Paraquat era o principal herbicida em uso. Assim, haverá um incremento de custo significativo para o produtor na operação de dessecação pré-plantio, pois as alternativas são tecnologia mais caras e muitas vezes sem apresentar um amplo espectro de controle quanto o do Paraquat. Na pré colheita, a principal alternativa é o diquat, no entanto, a disponibilidade no mercado deste produto para a próxima safra não será suficiente para atender a demanda. Assim, muitos produtores terão que colher sua soja sem dessecação, que também gera custos adicionais de colheita e secagem de grãos, além de eventuais reduções na qualidade do produto colhido.

4. Atualmente, temos visto lançamentos de produtos que compõe misturas de 2 ou mais princípios ativos. Em sua opinião, qual é a eficácia de se aplicar uma mistura? Isso deverá trazer algum impacto operacional?

A mistura formulada de herbicidas é uma prática comum, pois com isso aumenta-se o espectro de controle das plantas daninhas, principalmente quando o produtor apresenta problemas de folhas largas e gramíneas resistente ao glifosato na mesma área. Assim, entendo que uma mistura formulada é composta de uma formulação equilibrada, desenvolvida pela empresa, visando facilitar o manuseio do produto, quando comparado com uma mistura em tanque. Também entendo que as misturas formuladas facilitam operacionalmente ao produtor, pois evita que os operadores da pulverização tenham exposição aos produtos no processo de mistura em tanque.

5. Atualmente, em média, quantas espécies de plantas daninhas o produtor precisa enfrentar para garantir a sua produtividade e rendimento no campo? Qual é a cultura que mais é atingida por estas espécies?

A composição florística das espécies que compõem a comunidade de plantas daninhas em um sistema de produção é dependente da região do país e da cultura, além das condições edafoclimáticas. No entanto, geralmente são 5 a 6 espécies importantes, sendo que desta, na maioria das situações uma ou duas pode ser resistente ao glifosato. Dentre as espécies resistentes ao glifosato destacamos principalmente a buva (Conyza spp), caruru (Amaranthus hybridus), capim-amargoso (Digitaria insularis) e capim-pé-de-galinha (Eleusine indica) e azevém (Lolium multiflorum). As culturas de soja, milho e algodão são as mais afetadas, porém no sul do Brasil também as culturas de inverno sofrem interferência negativa destas plantas daninhas.

6. Pensando nos efeitos das plantas invasoras, dentro da cultura sem um manejo adequado, qual é o impacto no custo para o produtor? E na produtividade?

As plantas daninhas, quando não controladas podem impactar a produtividade em mais de 50%, portanto seu controle é economicamente necessário. No entanto, quando o manejo é inadequado estes impactos também são significativos, ou seja, cada planta de buva por metro quadrado que não é controlada na dessecação e infesta a cultura da soja após sua semeadura pode reduzir até 14% da produtividade. Assim, o bom manejo é fundamental não apenas dentro da cultura, mas também na pré semeadura ou dessecação. Outro aspecto a ser considerado é que as plantas daninhas são muito prolíficas, ou seja, produzem grande quantidade de sementes e seu manejo inadequado permite a chuva de sementes, incrementando o banco de sementes, o que torna o manejo no próximo ano mais complicado.

7. Atualmente, estamos vendo alterações em infestação de pragas por conta das mudanças climáticas, como os gafanhotos na América do sul e na Ásia. Essas influências também estão sendo vistas em plantas daninhas?

A flora daninha é dependente das condições edáficas e climáticas. Assim, mudanças climáticas podem alterar estas populações. A umidade é um fator chave necessário para a germinação e estabelecimento de sementes de plantas daninhas. As mudanças climáticas podem afetar a frequência e a intensidade das chuvas e resultar em eventos extremos, como inundações e secas.

8. Sabemos que o Brasil tem dificuldades em registrar novas moléculas e, com isso, o produtor rural precisa trabalhar com defensivos antigos. Como isso pode impactar, não só no custo, mas também no manejo em campo? As novas moléculas trariam um ganho muito grande no campo? 

O Brasil tem uma legislação bastante rígida para o registro de novos herbicidas e isso gera muitas vezes um baixo número de lançamento de novos herbicidas no mercado. Assim, o produtor precisa lançar mão de produtos que estão no mercado há bastante tempo, sendo, portanto, na maioria genéricos. Sendo assim, de um lado são produtos de baixo custo, no entanto não apresentam perfil toxicológico e ambiental como os produtos modernos. Neste sentido um aspecto que gostaria de destacar é a dose dos produtos antigos, que na maioria deles, são usados mais de quilogramas por hectare. No entanto, os produtos modernos são aplicados em termos de gramas por hectare, o que melhora consideravelmente as características toxicológicas e de impacto ambiental dos produtos. Assim, entendo que registro de novos produtos, modernos é uma necessidade urgente para que possamos tirar do mercado os produtos antigos de baixo perfil toxicológico e ambiental.

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